Quatro Poemas de Cida Pedrosa

Livro Gris, 2018

POEMAPRIMEIRA EDIÇÃO

8/25/20251 min read

vinil

à noite

a cidade muda de pele

a moça de vermelho

e coxas de pedra

serve um gim ao poeta

que tateia um verso

na vitrola anísio silva

diz que sofrer por ti é viver

à noite

a cidade muda de pele

e o homem da esquina s

e perde entre balas e fogos de festa

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céu de confeiteiro

uma fatia de céu

é dada

nesta noite de maio

quinhão que cabe ao homem

que da janela espera

a urbe apita

e o calor se faz bruma e precipício

uma fatia de céu

é dada

aos amantes da varanda

quinhão que cabe ao amor

em tempos de luas magras

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diáspora

abro os olhos

e a quarta-feira é cinza

as taras da noite me perseguem

neste quarto de hotel

é bom acordar sem deus

descer a rua

e ver o mesmo flanelinha no ofício

diáspora palavra que me segue

sem pedir perdão

sou retalho carne dilacerada

fragmento escuridão

abro as pernas no sinal

os carros passam

e o vento leva pó para o meu rosto

a noite chega

a quarta-feira é cinza

e faz tanto tempo que me perdi de

mim.

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historinha urbana

a bala passou de raspão na sua

cabeça

e recebeu a visita da realidade

os vizinhos não dormem mais

e o sangue é servido à luz do dia

a pelada domingueira

agora mofa no shopping

e vai longe o tempo em que a praça era cenário de

desejos

a amada está acessando a internet

contratou um personal e sonha com silicone e big brother

ontem na fila no supermercado

sobraram mais de cem

e ele a girar no carrossel

a bala passou de raspão na sua

cabeça

e recebeu a visita da realidade

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Poemas do Livro Gris, Ed. Cepe, 2018

Maria Aparecida Pedrosa Bezerra (Bodocó, 18 de outubro de 1963) é uma poetisa, advogada e política brasileira. Em 2020, foi eleita vereadora do Recife pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB).É autora do livro Solo para Vialejo, vencedor do Prêmio Jabuti 2020 nas categorias Livro do Ano e Livro de Poesia e do livro Araras Vermelhas, Melhor Livro de Poesia de 2022, pelo Prêmio APCA.