LILA MAIA

POEMAOITAVA EDIÇÃO

11/28/20252 min read

LIBERDADE (da Antologia Sete Vozes - editora da Palavra).

O poema não nasce urgente

Ele tem espantos e rumina imaturo

entre as portas do inferno e a vontade de galgar

qualquer muro de credo

Depois cheio de insulto, pranto, ele desce

como se fosse possível deflorar-se

ou penetrar mais fundo que o verme

O poema que era para ser unicórnio

dormindo sobre verdes pastagens

é apenas este leão possuído, devorado

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ESCRITA

(do livro As maçãs de antes)

Como não invocar o vício que certas palavras causam?

É mais fácil dispor de formas já encontradas que achar

a ponta do novelo perdida com o peso das mãos.

O poema às vezes é só um descuido doméstico:

a roupa deixada de molho por três dias,

o botão ligado do aquecedor.

E o poeta avança com seus braços sobre o papel.

Desconhece o deserto,

o gota a gota das palavras mais ávidas.

Depois cego ou talvez iludido,

sonha com a embriaguez perfeita dos excessos.

Então escreve pássaros, deuses, inferno.

Nada diz.

O poema é o exercício mais severo

de buscar formas no vazio.

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SEM AFLUENTES (do livro A Idade das Águas)

Nunca tive um amor simples

desses que cheiram o fruto

e mordem a carne.

Sempre meu corpo ilhado,

uma agonia de águas,

um barco exausto.

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A HORA DO SOL (do livro A Idade das Águas)

Não ofereço a outra face

porque tramo impassível com meu olhar.

Se ergo aos céus o que me fere

tudo é quase grito-canto de um silêncio tarde.

E nado em redes

peixe não chora.

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Lila Maia é maranhense e vive no Rio de Janeiro. Graduada em Pedagogia. Escreveu os livros de poemas: As Maçãs de Antes (vencedora do Prêmio Paraná de Literatura 2012. Com esse livro foi semifinalista do Prêmio Portugal Telecom de Literatura, hoje Oceanos), Céu Despido - 2004 (vencedora do II Prêmio Literário Livraria Scortecci-SP) e A Idade das Águas - 1997.

Em 2013, ganhou o concurso literário Coleção Vertentes da Universidade Federal de Goiás com o livro infantil Caixa de Guardar Amor e, em 2015, o concurso III Prêmio UFES de Literatura da Universidade Federal do Espírito Santo com o livro de poemas para jovens O Coração Range sob as Estrelas. Participou das Antologias de Poesia: Amar Verbo Atemporal - editora Rocco (2012), Sete Vozes - editora da Palavra (2004) e Próximas Palavras, editora da UERJ (2003), esta última organizada e com apresentação do poeta Ferreira Gullar.

Em 1998, teve três poemas publicados na Revista Poesia Sempre, da Fundação Biblioteca Nacional.