A poesia de Mariana Ianelli

Poemas extraídos do livro Treva Alvorada, ed. Iluminuras (2000).

POEMASEXTA EDIÇÃO

10/26/20251 min read

SOL DE NOVEMBRO

Tiraram-me tudo e o medo.
De corpo inteiro menor
E já o meu inferno é pequeno.

Roteiros não fazem mais sentido,

Suprir as reservas, apenas as de sono.

Como os dias são largos!

Abaixo os castelos,
Abaixo os andores.

Eu que ficava para não esquecer.

Que ultrapassava a montanha.
Eu que decantava o pó
Para trazer os vapores à tona.

Eu, a quem faltava uma seta

E sobravam direções.

Mas isso foi ontem e há muito tempo,

Quando não palpitava ainda
A necessária mortalidade das coisas.

...........

DE VOLTA A CASA

Dos tremores, antes a púrpura,

Uma febre langorosa

Entre o lampião e os incêndios.

Livre de razões e mais inocente

Já desfiadas as culpas,

As posses, as boas maneiras.

Miserável, mas de uma miséria

Tão pródiga, que em menos

Haja graça, e não carência.

A saúde dos humores, haja,

O escândalo da nudez displicente

Enquanto houver pouco e mel.

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TREVA ALVORADA

Absurda leveza que te faz afundar

E não é a morte.

Cumpres tua descida calado

(Uma palavra por descuido

Seria amputar a verdade).

Náufrago do tempo,

Tuas horas transbordam.

Dentro da lágrima,

Imensidão, já não choras.

Estrelas e estrelas,

Copulam a sede e o engenho

De que te alimentas

Como nunca te alimentou

O gosto da carne.

Tua face atónita

Se existisse uma face,

Tuas costas nuas,
Se a nudez fosse do corpo.

Um sorvedouro
Onde a paz dos contrários,
Treva alvorada.

Fecundado, flutuas.
É a lei da graça.

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Mariana Ianelli nasceu na cidade de São Paulo, em 1979. É escritora e crítica literária. Graduada em Jornalismo, fez mestrado em Literatura e Crítica Literária na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Escreveu livros de poesia, crônicas e obras para crianças.