A poesia de Ana Tapadas

Livro Sul Sereno

POEMAQUARTA EDIÇÃO

9/21/20252 min read

Planura

Amo planuras imensas

E gestos de linguagem muda!

Amo silêncios intensos

Onde o ser, às vezes, se transmuda!

Amo-te, porque te amo

Em definições extensas de dar...

E sinto-te quando te chamo

Dentro de mim, ao despertar!

Quero colinas e montes,

Plenos de canduras viçosas!

Amo regatos e fontes...

Doces meios-dias, manhãs brumosas!

Quero intensos verões

E frémitos escaldantes!

Doçuras de serões...

Nas noites aconchegantes!

Quero a tua voz poderosa

Sobre a minha rebeldia.

Amo a tensão amorosa...

De um puro dia a dia!

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Sul Sereno

Do eixo deste chão rasgado,

Brotará um dia novo...

Será então um sonho

O olhar promíscuo

Em direção ao caos!

Será embrião

E vida

E fogo!

Tudo recomeçará

Sem divisões,

Sem mar.

Ficará boiando, no azul,

A gestação secreta

Do novo ser,

Total!

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Credos

Havia, nos teus dedos,

Harpas e credos e medos...

Religiosidades evidentes...

Cenários e hinos e destinos iguais,

Ecos, vozes conhecidas, barros confidenciais!

Murmúrios orgulhosos, preces negociadas,

Pedidos, súplicas, coisas térreas e desejadas...

Interrogo esse teu Deus nos antípodas de tudo:

Orgulhoso, privilegiado, cómodo e mudo!

Essa ilusão tremenda e castradora,

Juiz supremo de uma crença redentora!

Havia, nos teus credos, mitos e lendas,

Palavras cavernosas, dias marcados, prendas...

Amores venais, gestos de convenção, rituais,

Pompas subtis, mentiras colossais...

E do alto dos tempos circulares...

Sem grandes brados, sem grandes ares,

Alguém disse: “Olhai os lírios, olhai a flor!

Despi os mantos, rasgai os tempos, vivei Amor!”

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Ana Tapadas nasceu numa região de Portugal chamada Alentejo, no concelho de Ponte de Sor, onde a densidade populacional (cerca de 19 habitantes por quilómetro quadrado) ilude as pequenas dimensões territoriais do país. Ser alentejana é isso: ter a capacidade de estar só na imensidão da planície, olhar a mutação da paisagem em quatro estações boreais bem definidas; saber que cada humano é uma pequena ilha; ser persistente e não desistir da Humanidade. Sabe ser uma pessoa tão banal que ousaria dizer que não tem uma biografia – vive. A sua vida relatar-se-ia em trabalho. O curriculum europass diz que trabalhou mais de quarenta e seis anos como professora do Ensino Secundário, tendo desempenhado diversos cargos de coordenação. Aquilo que mais fez na vida foi estudar - não existe sem isso. Coleccionou diplomas, mas não os afixa, pois julga que não a definem. Todo o resto é íntimo, feito de afecto e de laços profundos - acredita no Amor, na simplicidade e na Verdade antes de todas as coisas. A sua biografia resume-se a uma identidade que sabe transitória, assim sintetizada nos circuitos oficiais: Nacionalidade portuguesa; Data de nascimento em 23 de Janeiro de 1958; Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas pela Faculdade de Letras de Lisboa; Mestre em Literatura e Cultura Portuguesas pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.